segunda-feira, 29 de julho de 2013

Indústria: Aprendendo e crescendo e seguindo a lição...

A China disparou na corrida para ser o maior fabricante de automóveis e autopeças do mundo, com o primeiro trimestre de 2013 mostrando que o crescimento de seu parque automotivo cresceu 19,3% em relação ao mesmo período de 2012. Os Estados Unidos ficaram com o segundo lugar, com crescimento de magros 6,4%, e o Japão teve uma baixa de 9,6%. Se for considerado que os números chineses referem-se apenas a veículos de passeio, enquanto os demais englobam também comerciais leves, o buraco é bem maior. Aí, você se pergunta: mas como, repentinamente, a China se torna o maior produtor mundial de automóveis, se nenhuma de suas marcas eram, até bem pouco tempo, conhecidas e a qualidade de seus projetos e matéria prima são tão ruins? Como pode a Alemanha, berço dos mais cobiçados automóveis no mundo, ocupar apenas a sexta colocação nesse ranking, com acentuada queda de 13,1% em relação ao ano passado, enquanto a Índia ficou com a quarta posição? A resposta está justamente lá, na Ásia em geral e na China em particular. E não, antes que se pense besteira, os projetos chineses e sua matéria prima não melhoraram em absolutamente nada, assim como os outros países não pioraram seus produtos. O que aconteceu foi o seguinte:

A República Popular da China é o maior país da Ásia Oriental e o mais populoso do mundo, com mais de 1,3 bilhão de habitantes, mais ou menos um sétimo da população do planeta, o que é mais do que as populações da América do Norte e América do Sul juntas. Dos 50 países que constituem a Ásia, a República da Índia, na região sul do Continente, é o segundo país mais populoso do mundo, possui grandes depósitos de ferro, carvão, mica, manganês e alumínio, entre outros, e produz a maior parte do petróleo que consome. Fora estarem no mesmo continente, o que os dois países tem em comum é o fato de ter gente demais disputando uma mesma mínima fonte de renda. Isso faz com que, automaticamente, os níveis de remuneração caiam, já que há muito mais oferta de mão de obra do que vagas. Dessa maneira, temos o primeiro fator que explica essa aparentemente ininteligível expansão alucinante da indústria automotiva nos dois países: mão-de-obra de sobra a preço irrisório, exatamente o oposto do que se encontra na Europa, Estados Unidos e Japão. Para comprovar, a Tailândia é mais um país asiático que entrou na briga, e teve um aumento de impressionantes 47,9% de participação em comparação com o ano passado, e a explicação é a mesma.

Com toda essa mão-de-obra dando sopa, espaço de sobra e tecnologia de menos, os governos desses países usaram a inteligência, criaram taxações e impostos em níveis abaixo de poleiro de pato para exportações e atraíram as instalações e joint-ventures com os fabricantes europeus, norte-americanos e japoneses, esquecendo-se repentinamente que o dinheiro (em toneladas) que aportou em seus países é oriundo do capitalismo decadente ocidental e toda essa balela politica. Quando o assunto é dinheiro, é fácil ser atacado por uma amnésia seletiva que derruba as fronteiras entre democracia, comunismo, socialismo, capitalismo e outros “ismo” mais, e as religiões também deixam de dar as cartas. Além de resolver uma série de problemas, esses países incrementaram suas próprias industrias automotivas com o que estão aprendendo sobre tecnologia. Logo-logo, não precisarão de mais ninguém junto. O Brasil? Ah, sim, nós já fomos bons nisso, porém a bolha ilusória criada nos últimos anos enganou apenas a nós, nativos, mas não aos investidores e industrias estrangeiras, que não são desprovidas de inteligência, sabem que as coisas por aqui são extremamente volúveis e nenhum investimento é estável.

Ao contrário do Brasil, a China rapidamente, com o fim da Economia Planificada – copiada da Rússia comunista falida, implantada em 1949 pelo ditador Mao Tsé-Tung, que afundou o país em uma miséria total – e com a implantação da Economia Mista em 1978 – que acabou com a historia de tudo ser do Governo e seus dirigentes – abriram-se as portas das privatizações e da entrada de capital estrangeiro; assim, o mapa da China deixou de apresentar imensas plantações de arroz, chá e pastos para o gado para se transformar em grandes centros industriais. O país continua comendo o que produz, só que agora possui um poder de compra gigantesco, que lhe dá o direito de barganhar com quem e como quiser. Tanto que sua indústria se dá o direito de, vez por outra, copiar descaradamente produtos desenvolvidos em outros países, mudar o nome, comercializar e ninguém vai lá brigar por seus direitos.
De A a Z, a China possui, hoje, mais de 40 empresas voltadas a indústria automotiva, entre marcas próprias e joint-ventures, e um desmembramento interno dessas próprias empresas que criam outras marcas, algo meio confuso para nosso (ocidental) entendimento, além de toda uma indústria de abastecimento de peças, componentes e acessórios para sí próprias ou exportação.  

A história da indústria automotiva chinesa não é recente; nós, por aqui, é que nunca estivemos informados a respeito. Fundada em 1953, a FAW (First Automobile Works) lançou, em 1956 seu primeiro carro, o  Jiefang CA-30, iniciando a indústria automotiva do país. No final dos anos 1950 a 1960, várias fábricas de automóveis foram criados em Nanjing (Nanjing Automobile Group) Corporation), Xangai (Shanghai Automotive Industry Corporation), Jinan (China National Heavy Duty Truck Group) e Pequim (Beijing Automotive Industry Holding Corporation) e, em 1968, a Dongfeng Motor Corporation foi fundada. Mas a indústria de automóveis representou uma pequena parte da produção de veículos durante as três primeiras décadas da economia socialista da China. Em 1985 o país produziu um total de apenas 5.200 carros. Como a produção nacional era muito limitada, a importação aumentou dramaticamente, apesar da taxa de 260% de imposto de importação sobre veículos estrangeiros. Antes de 1984, o maior exportador de carros para a China foi – nem poderia ser diferente... – a União Soviética. Deste ano em diante, as exportações do Japão para a China aumentaram 7 vezes, pulando de 10.800 para 85.000 unidades e, em meados de 1985, a China já era o segundo maior mercado de exportação do Japão, perdendo apenas para os EUA, gastando cerca de US $ 3 bilhões para importar mais de 350 mil veículos, sendo 106 mil carros e 111 mil caminhões. Para frear essa farra, a liderança chinesa tomou as rédeas, aumentando os impostos e moratórias, além de fomentar a produção local, aumentando as varias joint-ventures existentes e atraindo novos acordos. Com o custo da mão-de-obra no patamar da mixaria, podendo levar seu projetos completos (além de desenvolver outros por ali mesmo), empresas como a American Motors Corporation, Chrysler, Volkswagen, Peugeot (PSA), Daimler, General Motors, BMW, Ford, Toyota e várias implantaram suas indústrias na China, algumas originadas a partir da indústria local, como Chang'an Motors, Changhe e Hafei Motor, algumas desenvolvidas a partir de antigas empresas estatais, como a BYD Auto, Brilliance Auto China, a Chery Automobile, e Changfeng Automobile, e outras sendo empresas de propriedade privada, como a Geely Automobile e Great Wall Motors. Hoje, as dez maiores fabricantes, que controlam diversas outros pequenos produtores são a SAIC Motor, Dongfeng Motor, First Automobile Works, Chang'an Motors, Beijing Automotive Group, Guangzhou Automobile, Chery, BYD Automobile, Brilliance China Auto e Jianghuai Automobile, exportam seus produtos para os quatro cantos do globo terrestre e o país é o maior produtor mundial de automóveis, atingindo a marca de quase 5.000.000 de unidades vendidas no primeiro trimestre de 2013. O Brasil teve as mesmas chances e oportunidades, e nunca soube usar. Sequer conseguimos criar uma montadora 100% nacional. A que tivemos usava motores Volkswagen, pagando royalties. Não aprendemos a fazer as coisas, mas os chineses souberam, cresceram e agora simplesmente dominam o setor, em menos de 30 anos.
Isso significa que, antes de você torcer o nariz para um carro declaradamente chinês, é interessante que verifique se o carro daquele cuja marca, aparentemente europeia, norte-americana ou japonesa que você tanto idolatra, não é Made In China.

Renato Pereira – blogtruecar@gmail.com

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